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O Desembargador que construiu o Solar do Unhão
11 de maio de 2021 às 13:45
O Desembargador que construiu o Solar do Unhão

O Tribunal da Relação, ao longo dos anos, recebeu elogios pela atuação de alguns de seus membros. Em 1687, ao se aposentar, o Desembargador Francisco Mendes Galvão foi enaltecido na Câmara de Vereadores de Salvador, pela sua total imparcialidade, sendo apontado como paradigma de Magistrado para as futuras nomeações.

O Solar do Unhão, belo conjunto arquitetônico, localizado na encosta da Capital da Colônia, foi construído, em 1690, pelo Desembargador Pedro de Unhão Castelobranco (seria algum antepassado do Desembargador Nilson Castelo Branco?). O imóvel contém casarão, atracadouro, senzala, fonte de água e uma igreja. À época, situava-se fora dos limites da Cidade. Esteve vinculado à Revolta dos Búzios (Revolução dos Alfaiates), em 1798, pois serviu de esconderijo. Atualmente, é um complexo cultural, abrigando o Museu de Arte Moderna da Bahia, cinema, salão de exposição e área para shows. Configura imensurável legado.

Já o Desembargador João da Rocha Pita, terceiro baiano a integrar a Corte de Justiça, foi louvado pelo Governador Antônio Luís Gonçalves da Câmara Coutinho, que encaminhou para o Conselho Ultramarino, no dia 25 de junho de 1691, o seguinte encômio: “DOUTOR JOÃO DA ROCHA PITTA SENDO FILHO DESTA TERRA E ESTANDO NELA HÁ TANTOS ANOS, VIVE SEM CASAR TENDO A IDADE DE 55 ANOS E PARECE QUE NÃO TEM PARENTES PELA ISENÇÃO NOTÁVEL COM QUE VIVE; E NÃO TEM FAZENDA NENHUMA NESTE ESTADO E VIVE SÓ COM SEUS ORDENADOS E LIMPEZA DE MÃOS COM GRANDE CRÉDITO DE MINISTRO DE V. MGE” (redação original).

No ano de 1692, Dionísio de Ávila Varieiro, Desembargador destemido, deslocou-se com cinquenta soldados para Porto Seguro, a fim de enfrentar criminosos, tendo os chefes sido apenados e enforcados.

Os embates entre o Poder Judiciário e o Governo-geral continuavam, a ponto do Governador Câmara Coutinho requerer a Portugal a nomeação de Desembargadores com faixa etária mais elevada, diante dos arroubos próprios dos mais novos.

No ano de 1693, o Desembargador João de Sousa apontou sete homens como autores de uma emboscada que objetivava a sua morte. Os acusados postularam o desaforamento, pois temiam o corporativismo dos colegas da vítima.

A prosperidade de Salvador levou a Coroa Portuguesa a fundar a primeira Casa da Moeda do Brasil, em 1694, tendo como Superintendente o Desembargador João da Rocha Pita, já no cargo de Chanceler da Relação. Seria mais uma atribuição, doravante, do Presidente do Tribunal.

No Governo de João de Lencastre (1694-1702), foram edificadas fortificações e construídos alguns imóveis para o serviço público, inclusive as sedes da Alfândega e da Casa da Moeda, na Praça do Palácio, nas proximidades do sobrado da Corte de Justiça, que teve seu espaço reformado e ampliado: no térreo, funcionava a Tesouraria da Colônia e, no primeiro pavimento, reunia-se o Tribunal.

A Relação da Bahia, em 1695, ganhou um grande reforço intelectual com a nomeação de Manoel da Costa Bonicho, professor da Universidade de Coimbra, para o cargo de Desembargador.

Naquele ano, a descoberta das jazidas de ouro, em Minas, faria com que o Império Português voltasse sua atenção para o sudeste da Colônia. O novo ciclo econômico traria prejuízos para o nordeste. O açúcar, que tinha o preço fixado pela Corte de Justiça, perderia a prioridade.

A Inquisição absolveu Gregório de Matos, depois de haver sido acusado de blasfêmia. Ele atraiu muitos inimigos, com sua irreverência, inclusive o Governador Câmara Coutinho, cujo sucessor, João de Lencastre, admirador do poeta, atenuou sua punição e o deportou para Angola, em 1694. Ao informar às autoridades portuguesas sobre os preparativos de uma revolta no solo africano, o “Boca do Inferno” recebeu, como recompensa, a autorização de retorno ao Brasil, todavia ficou impedido de residir em Salvador. Instalou-se no Recife e continuou escrevendo seus poemas satíricos. Ali, faleceria em 26 de novembro de 1696, poucos dias antes de completar sessenta anos, acometido de uma doença contraída na África.

Meses depois, ocorreria a morte do Padre Antônio Vieira, no dia 18 de julho de 1697, aos oitenta e nove anos, na Quinta dos Jesuítas, em Salvador, local do seu sepultamento e que abriga, na atualidade, o Arquivo Público do Estado da Bahia, guardião do acervo histórico do Tribunal da Relação.

As vidas de Gregório e Vieira se cruzaram, coincidentemente. Em períodos distintos, estudaram no Colégio dos Jesuítas e foram julgados pelo Tribunal da Relação da Bahia.

O Colégio dos Estudos Gerais dos Jesuítas de Salvador, em verdade, era uma pequena universidade, visitada por professores da Universidade de Évora, também da Companhia de Jesus, que rivalizava com a Universidade de Coimbra. Há quem sustente que o Colégio dos Jesuítas da Bahia, apesar dos requerimentos oficiais, não foi reconhecido como uma universidade, por receio de Portugal ter um centro de estudos superiores na Colônia. O próprio Padre Anchieta, também aluno do Colégio baiano, asseverou que a instituição de ensino, onde se lecionava Teologia, Artes, além de Fortificação e Artilharia (estas últimas compondo o curso de Engenharia), nada devia às universidades portuguesas.

O século XVII findava com uma boa nova para os Desembargadores da Relação da Bahia: sua remuneração foi reajustada, no ano de 1699.

Desembargador Lidivaldo Reaiche*

Fontes de pesquisa:
Burocracia e Sociedade Colonial: a Suprema Corte da Bahia e seus Juízes – Stuart Schwartz – Ed. Companhia Das Letras
Crônica do Viver Baiano Seiscentista – Obras Completas de Gregório de Matos – O Boca do Inferno – Ed. Janaína
História do Brasil – 1500-1627 – Frei Vicente do Salvador
Carta Ânua – Antônio Vieira
A Relação da Bahia – Affonso Ruy
História Geral do Brasil – Visconde de Porto Seguro
Memória da Justiça Brasileira, volume 1 – Tribunal de Justiça do Estado da Bahia
Memórias Históricas e Políticas da Província da Bahia – Anotações de Braz do Amaral – Inácio Accioli de Cerqueira Silva
Dicionário dos Desembargadores – 160-1834 – José Subtil
Tribunal de Justiça do Estado da Bahia – 410 anos fazendo história
Primeira Universidade do Brasil – Guia Geográfico – História da Bahia – Jonildo Bacelar

*O Desembargador Lidivaldo Reaiche Raimundo Britto retrata a História do Tribunal da Bahia, desde a época que funcionou como o Tribunal da Relação. Estudioso e pesquisador do tema, o Desembargador Lidivaldo é Presidente da Comissão Temporária de Igualdade, Combate à Discriminação e Promoção dos Direitos Humanos (Cidis) e membro da Comissão Permanente de Memória.

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Texto publicado: Desembargador Lidivaldo Reaiche