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O TRIBUNAL SUPERIOR DE JUSTIÇA – A RETOMADA DO CARGO DE DESEMBARGADOR – A PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL – A MORTE DO “ÁGUIA DE HAIA” – O LANÇAMENTO DA PEDRA FUNDAMENTAL DO FÓRUM RUY BARBOSA – LAMPIÃO NA BAHIA – A REVOLUÇÃO TENENTISTA E A ERA VARGAS
3 de outubro de 2023 às 14:19
O TRIBUNAL SUPERIOR DE JUSTIÇA – A RETOMADA DO  CARGO DE DESEMBARGADOR – A PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL – A MORTE DO “ÁGUIA DE HAIA” – O LANÇAMENTO DA PEDRA FUNDAMENTAL DO FÓRUM RUY BARBOSA – LAMPIÃO NA BAHIA – A REVOLUÇÃO TENENTISTA E A ERA VARGAS

O Rio de Janeiro já havia tido importante intervenção urbanística, a partir de 1903, pelo Prefeito do Distrito Federal, Francisco Pereira Passos, que demoliu vários quarteirões, para construir diversas avenidas, inclusive a atual Rio Branco, tudo acompanhado por J.J. Seabra, Ministro da Justiça.  Embora Advogado, este exerceu o cargo de Ministro da Viação e Obras Públicas, de 1910 a 1912, na gestão de Hermes da Fonseca, antes de se candidatar a Governador da Bahia.

O novo Governo de J.J. Seabra, iniciado em 1912, implantaria uma requalificação urbana no centro de Salvador, com o projeto de construção da Avenida Sete de Setembro, artéria larga unindo o Porto da Barra até o final da Ladeira de São Bento. A obra objetivava modernizar a velha capital baiana, contudo, provocou grandes danos ao patrimônio histórico e cultural. O Convento das Mercês e a Igreja do Rosário foram reduzidos e reformados, com novas fachadas. O imóvel do Senado Estadual teve sua ala direita extirpada, obrigando a transferência do Órgão. Por sorte, preservaram a ala esquerda, onde funcionava o Tribunal de Apelação e Revista, que escapou de novo trauma de demolição (já havia perdido sua sede própria, quando da edificação do Elevador Lacerda). Destruiu-se a  Igreja de São Pedro, localizada onde hoje está o famoso Relógio, erigindo-se outra na Praça da Piedade. O Mosteiro de São Bento, também, iria ser derrubado, mas a reação liderada pelo Abade Dom Maiolo de Cagny, que mobilizou a comunidade, obrigou os Engenheiros a desviarem o traçado da Avenida, criando uma curva visível. Ainda assim, pequena parte lateral da Abadia não sobreviveu. A onda desenvolvimentista, bastante criticada, atingiria a Igreja da Ajuda, a “Sé de Palha”, construída pelo Padre Manoel da Nóbrega, que acompanhou a comitiva de Tomé de Souza, trazendo a imagem de N. Sra. da Ajuda, na nau com o mesmo nome (o novo templo só ficaria pronto no ano de 1923).

Na Mensagem à Assembleia Legislativa, no ano de 1913, o Governador Seabra externou a sua preocupação com o estado precário da sede da Corte baiana:

“Não me tenho descuidado, aqui cabe dizer-vos, do Palácio da Justiça, indispensável obra que nunca alheei de minhas cogitações no plano das que deliberei fundar, servindo aos superiores interesses do Estado. Quando o ilustre Presidente do Tribunal de Apelação e Revista, no seu discurso deste ano, de abertura dos trabalhos de tão collendo areópago, reaffirmava aos seus ouvintes a grande necessidade, era no meu espírito, envolvido pela mesma convicção, a justa idéa, mas imperiosa no momento, porque tendo de ser cortado o edifício da Praça da Piedade, na metade em que funcciona aquelle Tribunal, eu carecia accomoda-lo em boas condições. De todo, então, perdidas as primeiras e duas tentativas feitas nesse sentido, recebi do digno Sr. Secretario do Estado esta lembrança que elle amplamente justificou: a de ser aproveitado para tão nobre fim, o Palacio das Mercês, que eu, acertadamente, lhe reservara à residência, ao qual, para o definitivo estabelecimento do Palacio de Justiça se uniria, obtido por desapropriação e reformado, o prédio junto; de modo que em grande bloco isolado, e na avenida, e com a vantagem de imensa economia para os cofres públicos, se teria pela reunião de ambos esses vastos edifícios em tempo breve, casa suficiente, em tudo distinta e de feição monumental, para o alto destino a que, com o mais honroso desprendimento, nos indica.

Tenho em estudo este assunto e conto assim resolvê-lo, se outra e melhor solução não encontrar ao caso, que não pode mais admitir as delongas de que tem resultado viver o nosso maior Tribunal de Justiça, como em clausura, no sitio de três apertadas salas, onde tudo lhe falta.

Ele há de ter, com o respeito que merece toda a magistratura, casa digna de suas elevadíssimas funções.” (redação original)

A onda de modernização avançava. Para a construção do Porto de Salvador, inaugurado no dia 13 de maio, derrubaram-se os velhos casarões da beira do cais do bairro do Comércio e aterraram considerável faixa marítima.

Desde o início da Primeira Guerra Mundial, em 1914, o Brasil vinha atravessando período difícil. Pouco industrializado, importava a maioria dos produtos. Durante o conflito, sua navegação viu-se prejudicada, pois a Alemanha era um grande parceiro.

Ruy Barbosa, no final daquele ano, assumiu a direção do Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros (atual Instituto dos Advogados Brasileiros), do qual havia sido um dos fundadores, em 1911.

Seabra tinha se mudado para o recém-inaugurado Palácio da Aclamação, porém a proposta de instalação da Corte de Justiça, no Palácio das Mercês, não foi acolhida, consoante a Mensagem do Governador de 1915:

“… tendo anunciado á Assembléia ser meu intento transferir para o Palacete das Mercês o colendo e superior Tribunal de Apelação e Revista, eu o deixei no antigo edificio de seus trabalhos, onde, apesar das obras que nele se executam, ainda conserva. É que o seu digno e ilustre Presidente, por motivos que, sem nenhuma indagação, logo respeitei, não me deu o seu acordo para a mudança projetada.” (redação original)

A 24 de maio, ocorreu uma reforma da Constituição do Estado da Bahia e o Tribunal de Apelação e Revista ganhou nova denominação, passando a ser Tribunal Superior de Justiça. Na sequência,  a Lei nº 1.119, de 21 de dezembro daquele ano, reintroduziu o nome do cargo de Desembargador.

Depois de tanta polêmica, a Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916,  instituiu o Código Civil.

O Presidente da Corte baiana, BRÁULIO XAVIER, na abertura do ano judiciário de 1917, ainda no imóvel mutilado da Praça da Piedade, asseverou:

“…sobre estas paredes derruidas, sobre estes alicerces partidos em sacrificio á civilização que se traduz no embelezamento e hygiene das cidades, surgirá em breve o palacio da justiça que tanto preoccupa actualmente a attenção do Illustre Governador do Estado e do seu digno, competente e incansável Secretário de Obras Publicas”. (redação original)

A partir de 1º de fevereiro, haveria um bloqueio naval alemão às nações inimigas. O Governo brasileiro protestou, porque suas exportações seriam afetadas.

No México, no dia 5 daquele mês, era aprovada a primeira Constituição que reconhecia os direitos trabalhistas.

Os alemães, em 3 de abril, iniciaram uma série de torpedeamentos de navios mercantes brasileiros: o primeiro, o Paraná, afundou nas proximidades da costa francesa. Consequentemente, o Presidente da República, Wenceslau Brás, anunciou o rompimento das relações diplomáticas com a Alemanha, determinando a apreensão  de  embarcações germânicas, atracadas nos portos nacionais. Na reunião realizada no dia 1º de junho, da qual Ruy participou, o Presidente revogou a neutralidade do país. O mundo estava convulsionado. Na Rússia, em 17 de outubro, os comunistas derrubaram a dinastia dos Romanov e instituíram um novo projeto político e econômico, sob a influência do Manifesto de 1848, lançado por Karl Marx. As monarquias europeias reagiram, mas a Grande Guerra impediu que a investida fosse completa, o que permitiu a vitória dos bolcheviques.  A 26 de outubro seguinte, diante de novos ataques marítimos, o Brasil declarou guerra à Alemanha.

Na segunda campanha para Presidente da República, em 1919, Ruy, disputando com Epitácio Pessoa. Na capital baiana, no início de abril, foi visitado pelos Desembargadores do Tribunal Superior de Justiça, que se queixaram da precariedade da sede do Sodalício. Contudo, mais uma vez, o insigne jurista não obteve êxito no pleito eleitoral do dia 13. Tentou impugnar a candidatura do adversário, porém não conseguiu. Em seguida, a 8 de maio, renunciou à Presidência da Academia Brasileira de Letras e desligou-se da Instituição, pois seu voto, por telegrama, a um escritor candidato, não foi computado.

Os países envolvidos na Primeira Grande Guerra Mundial, em 28 de junho, assinaram o Tratado de Versailles, com a imposição de pesadas sanções à Alemanha, ao Império Austro-Húngaro e ao Império Turco-Otomano. Criou-se a Liga das Nações, que cuidaria da manutenção da paz.

Na eleição para Governador da Bahia, Ruy participou ativamente da campanha do Juiz Federal Paulo Fontes, percorrendo algumas cidades do interior, inclusive a atual Senhor do Bonfim (antiga Vila Nova da Rainha)  no dia 19 de dezembro, sendo saudado pelo “Correio do Bonfim”, como “o maior dos brasileiros”. Entretanto, a 29 de dezembro, seu candidato perdeu para J.J.Seabra, que retornaria ao poder, tendo Ruy redigido um documento, questionando o resultado, também assinado por Luiz Viana e pelos irmãos João e Otávio Mangabeira. Outra crise se instalaria com a Revolta Sertaneja, movimentação dos chefes políticos no interior do Estado, detentores da patente de Coronel da Guarda Nacional, uma característica da República Velha.

O Presidente do Tribunal Superior de Justiça da Bahia, DESEMBARGADOR BRÁULIO XAVIER, a 18 de fevereiro de 1920, telegrafou a Epitácio Pessoa confirmando a invasão de vários Municípios por grupos de jagunços, inclusive liderados pelo Coronel Horácio de Matos (controlava a Chapada Diamantina), a caminho de Salvador, para garantir a posse de Paulo Fontes no Governo do Estado.

Em razão disso, por meio do Decreto nº 14.077, de 23 de fevereiro, o Presidente Epitácio Pessoa decretou a intervenção federal na Bahia, nomeando, para Interventor, o General Alberto Cardoso de Aguiar, que enviou contingente de seis mil homens, objetivando enfrentar o movimento e garantir a posse de J.J.Seabra. Em protesto, Ruy recusou a sua indicação como representante do Brasil, na recém-criada Liga das Nações.

No mês de março, o Interventor assinou os denominados “Convênios” com os Coronéis Horácio de Matos, Anfilófio Castelo Branco, Lindolfo de Sousa Estrela, Rosalvo Teixeira da Rocha e Abílio Rodrigues de Araújo, pacificando a Bahia e permitindo, no dia 29, a posse de J.J. Seabra.

Ruy se engajou para que os despojos do Imperador e da Imperatriz pudessem repousar no Brasil. Assim, em 3 de setembro, o Presidente Epitácio Pessoa assinou o Decreto nº 4.120, revogando o banimento da família imperial.

A 24 de dezembro daquele ano, inaugurou-se o “Monumento a Jesus – o Salvador”, obra do escultor italiano Pasquale de Chirico (1873-1943), que residiu e faleceu na capital baiana, autor das estátuas de Castro Alves, Conde dos Arcos e J.J. Seabra. A escultura foi encomendada e custeada pelo DESEMBARGADOR JOSÉ BOTELHO BENJAMIM. Natural de Lençóis, foi Promotor Público na Comarca das Lavras Diamantinas (atual Comarca de Lençóis) e Juiz de Valença. Estabeleceu-se em Salvador, no ano de 1898. Há um telegrama, de 29/07/1892, do Barão de Caetité, solicitando a nomeação do Magistrado para o Tribunal da Bahia (o original está no Arquivo Público Municipal de Caetité). De origem judaica, converteu-se ao Catolicismo e resolveu presentear os soteropolitanos. A estátua, esculpida em uma única peça de mármore de carrara e trazida de Gênova, a bordo do navio Cervino, foi concebida a partir de um quadro de Cristo, que existia na sala principal do Tribunal Superior de Justiça, pintado por Dulce Moreira Benjamim, em 1912, à época com quinze anos, sua filha e futura esposa do DESEMBARGADOR DEMÉTRIO CYRIACO FERREIRA TOURINHO. Para convencer os demais pares e não desagradar às autoridades da República, diante da laicidade do Estado,  o pai da jovem justificou que Jesus tinha sido o maior mestre do Direito e, para tanto, preparou o arrazoado “Jesus Cristo e suas leis”, conservado na Biblioteca do Tribunal de Justiça da Bahia. A escultura, inicialmente, esteve instalada em Ondina, e, com a construção dos prédios da Aeronáutica em 1967, a Prefeitura a colocou nas proximidades, local logo denominado  “Morro do Cristo”. Foi o primeiro monumento a Jesus, em um espaço público brasileiro, antecedendo o Cristo do Rio de Janeiro, erigido em 1933. O DESEMBARGADOR DEMÉTRIO TOURINHO graduou-se na Turma de 1909, na Faculdade de Direito da Bahia, a qual dirigiu de 1946 a 1952.  Presidiu a Corte de Justiça no biênio 1950/1951.  Um de seus filhos, Almir Benjamim Tourinho, exerceu a Presidência da OAB e do IAB, tendo sido, ainda, Professor de Direito Civil da UFBA.

No início de 1921, decepcionado com a política, Ruy renunciou ao cargo de Senador e, como Paraninfo da Turma de Bacharelandos da Faculdade de Direito de São Paulo de 1920, em comemoração ao cinquentenário de sua graduação, viu-se impossibilitado de comparecer à solenidade no dia 29 de março, por recomendação médica. Os formandos, desde dezembro, já haviam adiado a formatura, na esperança de tê-lo presente. Coube ao Professor Reinaldo Porchat a leitura do discurso “Oração aos Moços”, um dos mais belos e importantes textos de Ruy, muito  rememorado.

O povo baiano e até mesmo seus adversários o admiravam tanto que o convenceram a retornar ao Senado, em 5 de junho, com a iniciativa de J.J. Seabra. Coroando sua trajetória, no dia 14 de setembro, a Liga das Nações o escolheu como um dos Juízes da Suprema Corte Permanente de Justiça Internacional de Haia, alcançando a maior votação.

A saúde de Ruy continuava comprometida, entretanto, não cessavam as homenagens, inclusive de países estrangeiros, à sua vida dedicada à Nação. Durante as comemorações do centenário da Independência do Brasil, a Prefeitura do Rio de Janeiro apôs seu nome em uma das avenidas do bairro de Botafogo. A Academia Brasileira de Letras o indicou ao Prêmio Nobel de Literatura, a 19 de setembro. Debilitado, no mês de novembro, declinou do convite formulado pelo Presidente da República Artur Bernardes, para exercer o cargo de Ministro das Relações Exteriores.

Em 1922, a Semana de Arte Moderna, na capital paulista, seria um divisor na cultura brasileira. Os modernistas Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral, Anita Malfatti, entre outros, causariam espanto e contestação com suas obras.

No verão de 1923, Ruy instalou-se em Petrópolis, objetivando a sua recuperação física. Sempre preocupado com o destino político da Bahia, reuniu-se, no dia  27 de fevereiro, com políticos de sua terra natal, visando à discussão sobre a sucessão governamental. Na mesma noite, teve o estado de saúde agravado. Uma junta médica identificou ser ele portador de paralisia bulbar, causada por toxemia. Ainda podendo se expressar, Ruy asseverou: “não há nada a fazer”. A 3 de março, após haver recebido`, à tarde, a unção dos enfermos, morreu às 20h25. No dia seguinte, Artur Bernardes decretou luto nacional por três dias. O falecimento comoveu o povo brasileiro. Um trem especial transportou o corpo para a sede da Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro. Ali, no dia seguinte, discursaram: o baiano Antônio Constâncio Alves (Academia Brasileira de Letras); o Deputado Federal José Gabriel Lemos Brito (representando a Bahia); o imortal da ABL, Coelho Neto (em nome da Liga de Defesa Nacional); e o Ministro da Justiça João Luís Alves.  No Cemitério São João Batista, houve pronunciamentos de Rafael Pinheiro (pelo Distrito Federal), de João Mangabeira (em nome dos amigos) e do Cônsul da Argentina, Pedro Gaytia.

Logo após a morte de Ruy, um incêndio, em 6 de junho,  destruiu o Theatro São João, que estava desativado, onde ele e Castro Alves falaram para o público. Foi a primeira grande casa de ópera do Brasil e diversas companhias internacionais ali se apresentaram.

O falecimento de Ruy impulsionou a ideia da Bahia homenageá-lo, com seu nome, na futura sede do Tribunal Superior de Justiça, que ainda se encontrava mal instalado na Praça da Piedade.  A área contígua, surgida com a demolição da metade do imóvel, fora destinada à edificação do novo prédio do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (IGHB), inaugurado a 2 de julho.

O DESEMBARGADOR PEDRO RIBEIRO DE ARAÚJO BITTENCOURT, tendo sucedido BRÁULIO XAVIER na Presidência da Corte de Justiça desde 1920, havia se pronunciado na abertura do ano jurídico de 1923, realçando:

“A installação dos Tribunaes em local condigno é condição primordial de sua existência. A solenidade para os actos daquelles que assumem poderes tão importantes deve ser constantemente observada. Já o disse o distincto publicista: a magistratura é como os cultos religiosos: quanto mais o cercarem de apparato mais lhe crescerá o prestígio”.

Conferências tenho tido com o Excmo. Sr. Dr. Governador do Estado e ainda não me foi possível uma solução definitiva que, espero, seja dado este anno pelo nosso Poder Legislativo, habilitando o Executivo a levar a effeito a construção do nosso edifício, que poderá ter o seu início por occasião das projectadas festas do Centenário da Independência da Bahia”. (redação original)

A Bahia prestaria homenagem post mortem aos seus dois filhos mais ilustres. No mesmo dia em que, diante dos escombros do Theatro São João, J.J. Seabra (retornou ao Governo sucedendo Francisco Muniz de Aragão) inaugurou a estátua de Castro Alves (a Praça o reverenciava com seu nome, desde 1881), uma cerimônia ocorreu na esquina da Rua do Tingui, no bairro de Nazaré, tendo a imprensa divulgado que, após escavação, inseriu-se uma urna contendo a ata da solenidade, jornais e moedas. Sobre a lápide, o seguinte registro: “Em 6 de julho de 1923  – Foi collocada pelo excmo. sr. dr. J.J. Seabra, Governador do Estado, a primeira pedra do edifício destinado ao Palácio da Justiça da Bahia”. (redação original)

Na abertura dos trabalhos de 1924, o DESEMBARGADOR PEDRO RIBEIRO mencionou o evento:

“Entre os diversos números do programa das festas do Centenario da Independencia da Bahia, solicitei da Commissão respectiva fosse incluido o referente á colocação da 1ª. pedra da construcção do Palacio da Justiça, a grande aspiração do fôro baiano, por cuja realização venho me esforçando desde que assumi a presidencia deste Tribunal, e para o qual o Congresso votára uma lei com a devida auctorisação. E, com a presença das principais auctoridades do Estado, magistrados, Presidente e membros do Instituto dos Advogados, teve logar a cerimonia respectiva”. (redação original)

O Presidente Artur Bernardes editou o Decreto nº 4.789, de 2 de janeiro daquele ano, autorizando a União a adquirir o imóvel pertencente a Ruy, situado  na Rua  São Clemente, nº 134, no bairro de Botafogo, no Rio de Janeiro, com todo o seu acervo. Do ato, constou que, na Biblioteca,  haveria uma seção nominada Maria Augusta.

Na antiga Vila de Abrantes, havia os distritos de Abrantes, Monte Gordo, Ipitanga (atual Lauro de Freitas) e Camaçari. Homenageando o DESEMBARGADOR TOMÁS GARCEZ PARANHOS MONTENEGRO, cujos antepassados eram os proprietários de extensas terras, tendo ele doado áreas, objetivando a instalação da ferrovia naquela região, a Lei Estadual nº 1.809, de 28 de julho de 1925, alterou o topônimo de Abrantes para Montenegro e transferiu a sede para o Arraial de Camaçari, elevado à categoria de Vila. Somente em  1938, por meio do  Decreto-lei  Estadual nº 10.724, de 30 de março de 1938, o Município passaria a denominar-se Camaçari.

No começo dos trabalhos de 1926, o incansável DESEMBARGADOR PEDRO RIBEIRO ressaltou o trecho de uma entrevista sobre a situação preocupante das instalações do Poder Judiciário baiano:

“Se o advogado não contar com boas pernas – escrevera um jornalista – se não as tiver rijas, resistentes, não dará conta de sua tarefa, pois nem um automovel adianta, uma vez que os cartorios da Bahia são situados em ruas taes que nenhum automovel, ainda mesmo Ford, pode estacionar á porta ou nas suas circumvisinhanças”. (redação original)

O artigo jornalístico, quanto à obra, acrescentava: “sendo uma despesa necessaria e inadiavel é também – de algum modo – compensadora financeiramente”… “os commodos occupados pelos serventuários da Justiça serão taxados pelo governo e constituirão renda do Estado. Por outro lado podem haver compartimentos alugaveis aos advogados conciliando-se a conviniencia reciproca destes e do governo” (redação original)

A Coluna Prestes, comandada pelo lendário Capitão Luís Carlos Prestes, em abril daquele ano, embrenhou-se pelo interior da Bahia, atravessando o Rio São Francisco e adentrando a Chapada Diamantina, onde encontrou a resistência dos Coronéis, mormente de  Horácio de Matos, cuja milícia a seguiu até a fronteira com a Bolívia.

Ao presidir a abertura dos trabalhos do ano de 1928, o persistente DESEMBARGADOR PEDRO RIBEIRO salientou que o Fórum se  encontrava no “inadequado Convento da Palma e em cartorios espalhados pelas mais escuras viellas da antiga cidade colonial”. (redação original)

O grupo de Virgulino Ferreira da Silva, o “Lampião”, no mês de dezembro de 1928, é visto,  pela primeira vez, na Bahia e, a partir daí,  causaria pânico à população das pequenas vilas e cidades. Os “cangaceiros”, como eram chamados, desafiavam as volantes da Polícia e gostavam de humilhar as autoridades. Em Queimadas (antiga Vila de Santo Antônio de Queimadas), localizada no sertão, cerca de trezentos quilômetros de Salvador, no dia 22 de dezembro, houve a chacina dos Soldados da PM. Por volta das 15h30, daquele fatídico domingo,  Lampião e seu bando (integrado por quinze homens) se dividiram. Um grupo se dirigiu à Estação de Trem, vindo a cortar os fios do telégrafo e a roubar o dinheiro; o  outro seguiu para a Delegacia/Cadeia Pública, rendeu os  Policiais e libertou os presos. Usando um apito, Lampião convocou os demais integrantes do efetivo do Destacamento, atraindo, inclusive, o Sargento Evaristo Carlos da Costa, que se viu obrigado a acompanhar os bandoleiros nos saques pela Cidade. Após encarcerar os Soldados, Lampião rumou em direção à residência (também local de trabalho) de Manoel Hilário do Nascimento, Juiz Preparador (Juiz do Termo – Município que não era sede de Comarca), obrigando-o a intimar os mais afortunados para doarem dinheiro e joias, o que ocorreu. Discriminando o Magistrado, o Escrivão, o Oficial de Justiça e o Tabelião, por serem negros, disse: “Que terra desgraçada; toda a justiça é negra”. Perguntou ao Juiz: “Então, você é mesmo doutor?” Ante a resposta positiva, ordenou que lhe mostrasse as mãos e, verificando que não eram calejadas,  afirmou: “Que negro bom para uma enxada”.  Depois da arrecadação das doações, por volta das 18h, retornou à Delegacia/Cadeia Pública e, no meio da rua, determinou que os Militares, chamados por ele de “macacos”,  tirassem as “caneleiras”, o que os obrigava a se abaixarem, facilitando o disparo do tiro de parabelo (pistola) na cabeça, tendo sido  executados Olímpio B. de Oliveira, José Antônio Nascimento, Inácio Oliveira, Antônio José da Silva, Pedro Antônio da Silva e Justino Nonato da Silva, cujos corpos foram, também, atingidos por golpes de facas e punhais desferidos pelos facínoras. Somente o Soldado Aristides Gomes de Souza enfrentou Lampião.  Corajoso,  tentou agredi-lo  e o desafiou para um duelo, afirmando que este só era “macho” armado. O cangaceiro adolescente Antônio dos Santos, “Volta Seca”, o apunhalou até a morte e, segundo narrativas, passou a lâmina do punhal, com o sangue da vítima,  na própria língua.  Pouparam a vida do Sargento Evaristo, a pedido de Austrialina Teixeira (Santinha) que, como ele, professava a fé Batista,   recompensada por ter dado seu trancelim de ouro a Lampião. Os criminosos deixaram Queimadas, na madrugada do dia 23 de dezembro, não sem antes  assistirem à parte de um filme no cinema e realizarem um baile no clube da Cidade.

A crise de 1929 (“crack”) da Bolsa de Valores de Nova York, no mês de outubro, abalou a economia mundial, afetando o Brasil, gerando milhares de desempregados, ausência de crédito, falências de estabelecimentos bancários e comerciais, suicídios, prejudicando as lavouras cacaueira e cafeeira.  Em razão disso, o Governo do Estado atrasou  a edificação da sede própria do Tribunal. O Governador Vital Soares até que se esforçou, adquirindo um imóvel para o Poder Judiciário na Praça Duque de Caxias, na Mouraria, a fim de desafogar os serviços.

A eleição presidencial de 01 de março de 1930 seria emblemática. A chapa integrada pelo paulista Julio Prestes e o baiano Vital Soares venceu o gaúcho Getulio Vargas e o paraibano João Pessoa. Muitos protestos reverberaram com acusação de fraude. Porém,  o assassinato de João Pessoa, vítima do desafeto pessoal João Dantas, em 26 de julho, no centro do Recife, acirraria os ânimos.

Nesse ínterim, o Presidente Washington Luís, na presença de Maria Augusta e familiares, no dia 13 de agosto, inaugurou o Museu Ruy Barbosa, criado pelo Decreto nº 17.758, de 04 de abril de 1927, no imóvel adquirido pela  União.

Na Bahia, o Governador eleito, no dia 07 de setembro,  Senador Pedro Lago (ocupou a vaga de Ruy), não tomou posse. A insatisfação dos jovens Tenentes do Exército gerou um levante, a 03 de outubro. Dois dias depois, O Estado já tinha um executor do estado de sítio decretado, o General Santa Cruz, que embarcou no Rio de Janeiro, a bordo do navio Comandante Capela. O Governador em exercício, Frederico Costa, que não apoiou a Revolução Tenentista, aguardava a vinda das milícias sertanejas. O Major Juarez Távora, da Paraíba, tentava organizar as forças no Nordeste.

Com a deposição de Washington Luis, no dia 24 de outubro, pelo Alto Comando das Forças Armadas, uma Junta Militar assumiu o poder, e Frederico Costa optou por transmitir o cargo de Governador da Bahia ao Presidente do Tribunal Superior de Justiça, DESEMBARGADOR PEDRO RIBEIRO, que, por sua vez, preferiu consultar o General Santa Cruz, a bordo do navio Comandante Capela, que o orientou a aguardar, pois nenhum ato ilegal poderia ser praticado. Este concentrou tropas em Alagoinhas, para barrar os jagunços.

Na sequência, o Senador Estadual Wenceslau Guimarães se arvorou em exercer a Chefia do Executivo, mas foi rechaçado pelo Major  do Exército Custódio dos Reis Príncipe Junior, representante do novo Governador escolhido pela Junta Militar, Coronel Ataliba Osório, Comandante da Região, que assumiria no dia 25.

Getúlio  seguiu de trem do Rio Grande do Sul, com grande efetivo de Oficiais, em comboio, parando nas várias estações, incluindo São Paulo. De lá partiu para o Rio de Janeiro, desembarcando na  Central do Brasil, no final da tarde de 31 de outubro.  Instalou a “Era Vargas”,  dando um basta na “política do café com leite”, pela qual as lideranças paulistas e mineiras se revezavam no Governo Federal. A ruptura institucional, que com certeza, teria o repúdio de Ruy, pôs fim à República Velha e à Constituição de 1891, extinguindo o Congresso Nacional e os Parlamentos dos Estados. Getúlio governaria por meio de decreto-lei e não demoraria para ser acusado de ditador.

O primeiro Interventor civil da Bahia,  Leopoldo Afrânio Bastos do Amaral, assumiu no dia 1º de novembro.

Houve uma mobilização do Governo para a pacificação do interior da Bahia, tendo os Coronéis concordado com a entrega do armamento. Horácio de Matos, Intendente de Lençóis e chefe político de doze municípios, acreditando no regime getulista, protagonizou a deposição. Todavia, ao disponibilizar o último lote de armas, no dia 30 de dezembro, foi preso pelo Tenente Pamplona e levado para Salvador, sendo custodiado na Casa de Detenção, no Forte de Santo Antônio Além do Carmo.

O Júri e as Varas da primeira instância ainda funcionavam no Convento da Palma, quando o Tribunal Superior de Justiça instalou-se no casarão do recém-extinto Senado Estadual, situado no Terreiro de Jesus, nº 17.  Aguardava-se, pacientemente, o início da edificação da sede própria. O sobrado provisório não traria bons momentos para os Desembargadores: uma excomunhão coletiva e um homicídio abalariam a Corte.

Desembargador Lidivaldo Reaiche Raimundo Britto
Sócio do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia

BIBLIOGRAFIA

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Rui Barbosa – Cronologia da vida e da obra – Fundação Casa de Rui Barbosa – Rio de Janeiro – 1999
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Tribunal de Justiça do Estado da Bahia – 410 anos fazendo história – Tribunal de Justiça – Salvador  – 2019
Volta Seca e o Estranho Mundo dos Cangaceiros – Estácio de Lima – Rio do Engenho – e-book – Editora Universitária do Livro Digital – 2020
Antecedentes Históricos do Fórum Ruy Barbosa – Carlos Alberto Carrillo – Tribunal de Justiça do Estado da Bahia –  2023

Texto publicado: Desembargador Lidivaldo Reaiche Raimundo Britto